( "Cinema é a melhor diversão."  Será? )
LUZES !
          - Não dê refrigerante para eles, senão vão querer fazer xixi no meio!
          Ansiosa, ela aguarda a hora de entrar no cinema com mais um sobrinho de três anos. Presentes, também, a sobrinha de seis anos e o pai dos dois, irmão dela. Toda a família disse que, com ESSE, ela não conseguiria. É o desligamento em pessoa, ou melhor, em criança. Mundo da lua, dos sol, das estrelas. Tia bastante atuante, seu maior orgulho é de ter introduzido, no mundo cinematográfico, os mais velhos, com a mesma idade de três anos. Assim foi com "Peter Pan", "A Bela e a Fera", "Aladim". Nos momentos em que as histórias ficavam mais monótonas, ela entrava com as explicações que mantinham a atenção do (a) Pirralho (a). Depois, era só correr para o abraço, quer dizer, ir direto para a livraria comprar o livro do filme. Ela, professora, exultava!
          Mas, com ESSE, não foi bem assim...
CÂMERA !
          O filme da vez é "Mulan". Sentados em seus lugares, ela ensina para ele que cinema é uma tela bem grande, com muitas pessoas assistindo e aproveita para dar uma pequena ideia do enredo.
          - Não vou conseguir?! Eles é que pensam! - pensa, confiante.
          Logo em seguida, ele aponta e fala bem alto:
          - Olha, olha!
          - O quê? - pergunta ela, achando que já é efeito dos ensinamentos.
          - Uma meleca!
          Está certo, cinema é festa, tem que limpar o 
salão. Enfrentando olhares de asco, limpa o dedo dele com um guardanapo de papel. Luzes apagadas, começa a sessão.
          - Tá escuro! Cadê o cinema? - berra ele.
          - Ali, ali. - direciona a cabeça dele para a tela.
          - Cadê a Mulan?
          - Calma, já vai começar.
AÇÃO !
          O filme inicia e as explicações também, mais cedo do que de costume.
          - Por que a Mulan tá chorando?
          - Porque o pai brigou com ela. - sussurra para não incomodar os outros.
          - Ela quem?
          - A MULAN !!! - se impacienta.
          - Xxxxxx ! - pedem os outros.
          Pega ele no colo e explica. Deixa ele despentear o cabelo dela e explica. Tenta antecipar a cena seguinte, cochichando, claro, e explica. Qualquer coisa para não incomodar.
          - Xxxxxx !!!
          O irmão (e PAI!) finge que nem conhece, ao lado da filha. E acusa, rindo:
          - Você é que inventou!
          A culpa é ainda maior por não poder dar atenção à sobrinha. Repentinamente, ele se levanta:
          - Tô de mal com você, eu agora sou amigo do tio Paulinho.
          - Mas o tio Paulinho nem está aqui. Vem cá, vem cá! Olha a Mulan, a espada, a luta, vai vencer!
          - Xxxxxx !!!
THE END !
          Acaba o filme. Aos trancos e barrancos, ela conseguiu! É como ganhar um Oscar pelo desempenho de coadjuvante daquele ator principal mirim.
          - Regina, olhe no espelho, você parece a Medusa.
          O cabelo crespo e volumoso, de tanto que ele mexeu, é uma homenagem ao monstro mitológico, depois de um choque elétrico, além das assustadoras olheiras profundas. Não se incomoda, tamanha a sensação de vitória.
          - Meu amor, você viu tudo!
          E o irmão:
          - Filho, você gostou do filme?
          - Que filme a gente viu?
          Quase arranca o cabelo (estava horrível mesmo!) e chora (para piorar as olheiras). Mas ainda vinha mais.
          - Quer ir ao banheiro? - pergunta o pai.
          - Não. A tia Regina disse que ia comprar o livro para mim.
          A alegria volta e, toda orgulhosa, leva-o à livraria. Ao entrarem, o atencioso vendedor pergunta:
          - O que o 
senhor deseja?
          - Cocô! - responde ele.
          - À esquerda, lá fora! - mostra o enojado rapaz.
          - Corre, corre!
          Foi por pouco. E, para um final infeliz, vem o pior da história. Hoje, aos dezenove anos, quando a tia conta:
          - Não lembro de nada.
          Apaguem as luzes!!!